Wednesday, April 11, 2012

Nordestino arretado!



Daniel Magalhães

"Teve um sujeito qui disse
Qui o sertanejo era um forte.
Grande novidade!!!
Quem pode ir de encontro a sorte?
Se num lutar pela vida,
Finda esbarrando cum a morte.

Acho engraçado as coisas como são:
Só chove no litorá!
Mas prá que tanta água ali
Onde tanta água há?
Mas bem qui diz o ditado,
Qui a água só corre é pru mar.
Ói São Pedro, eu fico tão indiguinado
Que digo em presença tua:
Será qui a chuva na praia,
Só vem vê mulé nua?
Se ele gosta do qué belo,
Diz prá vim vê nossa lua.

Ô São Pedro! Pru Nossa Sinhora!
Se desse prá juntá as lágrimas
Dos sertanejos qui chora
A seca do meu sertão,
Dava pra enchê uma açude,
Qui isborrava o paredão.

Astrudia no Rio
Uma comissão prá istudá
Os problema do Nordeste.
Sabe onde fôro se hospedá?
Na grande Hoté Boa Viage,
Bem na beirinha do mar.
Aí São Pedro nesses trei dia,
Parace pru marcação,
Abriu as portas do céu
E fincou água no chão.

Aí os dôto telefonaro
Pru Presidente da Nação:
Tá tudo preso no hoté,
Nós num pode sair não.
Até a data de hoje,
Nós num fez reunião
E prá incurtá essa cunversa.
Nós num intende desse sertão.

Dotô!!! De riba do grande Hoté,
A coisa é mesmo qui queijo.
Vai pru sertão, fi da peste,
Te arrancha no ranco dum sertanejo.
Vai cuincê o lugá
Adonde mora o disprezo.

Durma numa rede dotô,
Cum o ispinhaço invergado,
Ô nuns catatau de vara,
Numa furquia inganchado.
Bata mão duma foice,
Duma inchada ou dum machado,
Vá cum o dia quilariando
Arrancá tôco no roçado.

Beba água di barrêro
Daquelas água barrenta.
Almoçe carne de bode,
Só cum farinha e pimenta.
Volte pru roçado dotô,
Prá vê si vosmicê aguenta.

Ah! Se o sinhô criasse corage
E um dia fosse pru lá.
Eu ia lhe mostrá coisa
Do sinhô si arripiá.
la lhe mostrá dotô,
Um tatú cavando,
Três metro de chão adentro,
Atrai dum gôgo mago,
Qui lhe sirva de alimento.
O tatu também é gente, dotô,
Também sofre o sofrimento.

Eu ia lhe mostrá dotô,
Milhares de caveira, ispalhada pelo chão,
Um minimo discalço, istrada à riba,
Istrada à baixo, com um badoquim na mão.
Atrái duma rolinha, dum bentiví,
Dum mané-mago, dum caga-sêbo,
Do qui tivé puralí,
Qué pra ajudá no almoço, dotô
Avalie!!!

Dotô, bata nos peito. Crie corage!!!
Diga assim: Vou no sertão.
Vô vê se Danié fala a verdade
O não.

Agora tem uma coisa dotô:
Quando vosmicê chegá
E pru meu sertão ispiá,
Vai inxergá o retrato
Dum difunto no caixão"

Estes versos foram declamados pelo poeta Daniel Magalhães, em 1959 aos técnicos da recém-criada Sudene que faziam parte da comitiva do presidente Juscelino Kubitschek. Os mesmos estavam hospedados em um Hotel defronte ao bar que estava o poeta. Naquele ano o nordeste passou por uma grande estiagem(seca).(foto:Tatupeba)








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