Sunday, July 29, 2012

VIOLEIROS E REPENTISTAS


Lauro Cysneiros

Poesia da alma sertaneja. Belíssima tradição desses recantos longíquos daqueles gritos saudosos das seriemas esquivas. Proscênio encantador dessa poesia, inspirada à pacatez dessas paisagens ingênuas daquela vasteza infinita, de imperecíveis recordações!... onde, parece-me, decorreram os dias mais felizes de um trecho da minha vida... senão, mesmo, o a mais suave período de funcionamento público nas diferentes Municipalidades pernambucanas, a mais ingrata carreira que me coubera em espécie.

Belém de São Francisco. Pequenina e interessante cidade sertaneja situada bem nas margens do majestoso rio daquelas regiões nordestinas.

Na excentricidade poética dessa terra bravia, onde prolifera o chique-chique e o facheiro, à infinidade dessa cardite espínea que alastra, em grande parte, a ressequida gleba sertaneja, descansa a pátria dos "imortais" Violeiros e Repentistas. Esse glorioso berço de um Silvino Pirauá, devaneando aos maviosos acordes da sua enternecente viola, à ofuscação deslumbrante do merencório luar sertaneja... e que, hoje dorme o sono profundo no insondável do além...

Dorme, poeta! e aceita

Meu abraço comovido,
Tão cheio de nostalgia.
Ao cantor estremecido,
Aquele vate querido,
Que dorme agora esquecido,
Debaixo da terra fria...

É francamente, admirável a virtude, evidentemente sentimental, da alma sertaneja. Surpreende-nos aquela facilidade que empresta, com tamanha elegância e visível naturalidade, aos seus expressivos repentes.

Aqui, me vem à memória essa quadra originalíssima de um maravilhoso repente do afamado violeiro Antonio Marinho, natural de São José do Egito, dirigida a um seu colega de não menos relevo genérico:

"Canta, canta, Mergulhão,
Desempenha os teus papéis,
Eu também sou cantador,
E já fui como tu és,
Perdi noventa por cento,
"Tô" me arranjando com dez".

São raridades essas que lhes vem do berço. É um campo sem cultura, mas onde a natureza lançará a semente de origem, para brindar-nos com a primazia da insopitável colheita.

Eu te bendigo, poeta! nessa admirável constante da tua fascinante obscuridade!...

Eu te exalto a memória, na indelével saudade dos tempos que se foram...

Dorme, poeta, teu sono,
Descansa, nesse abandono,
Jóia perdida... sem dono...
Qual um mísero proscrito,
Embora sempre abraçado,
Com tua viola de lado,
Ao chão abençoado,
De São José do Egito!...

(Fonte: Publicado no Jornal "O Monitor" em março de 1980. Lauro Cysneiros foi escolhido por Agamenon Magalhães o homem de confiança para Celso Galvão. Foi amigo de todos os seus colegas de repartição, chegando, pela confiança que tinha, assumir temporariamente as funções de prefeito.)

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